Ou: Senta que lá vem história.
Foi no final da década de 80 que descobri
Jane Eyre, numa sessão da madrugada na TV Cultura. Em preto-e-branco na sala escura, os olhos do Conde Edward Rochester me assombravam e não consegui sossegar enquanto não descobri mais sobre ele. Que era
Orson Welles eu sabia, mas a Internet ainda não existia pra essas bandas. Era o tempo, ainda, dos catálogos da Ediouro; foi ali que encontrei o
livro de Charlotte Brontë [com essa mesma capa] que viria a ser o meu livro favorito de todos os tempos
éva.
Muitos anos depois, assisti
outra versão de
Jane Eyre, mas não me marcou como a primeira vez. A história depende muito da interpretação dos dois atores principais e [acho que já comentei isso uma ou duas vezes no PdUBT antes] a dupla Charlotte Gainsbourg/John Hurt não me ganhou.
Os planos pra reler o livro no original já estavam feitos no ano passado, quando miguxo me enviou a lista dos concorrentes para o
Golden Globe e vi uma atriz concorrendo na categoria de minisséries ou filme feito para a tv na temporada 2006/7 por...
Jane Eyre!
Só se ouviu um cataploft.
Graças à Fernanda e à Tati, que me fizeram insistir pela terceira vez no cadastro do
IsLife depois de não ter conseguido em duas, encontrei os quatro episódios da
minissérie da BBC pra baixar [nunca vou agradecê-las o bastante por isto!].
Assisti neste final-de-semana.
Preparei coração e mente para evitar comparações com a versão de 1944 mas, depois de 15 minutos, não dava pra disfarçar mais: a maioria das seqüências era copiada plano-a-plano! Podia pensar que fosse natural, afinal não dá pra inventar muito quando se trata de adaptar o mesmíssimo livro. Daí vem a cena em que Jane criança encontra-se com
Mr. Brocklehurst e a semelhança me deixa sem fôlego, com o enquadramento das personagens idêntico: Mr. Brocklehurst visto de baixo pra cima e Jane, de cima para baixo, tanto no filme quanto na minissérie.
Era a senha pra começar a comparar sem culpa! E, visto que o
Jane Eyre de Orson Welles é um dos meus filmes top favoritos, foi até um ponto a favor pra minissérie, uai. [Pequena observação pessoal: eu tenho uma bronca contra atrizes bicudas. Me incomodam, não pergunte o motivo, Calista Flockhart, Elizabeth Mitchell, Claire Forlane... até a Evangeline Lilly mirrita. Quando vi a Ruth Wilson já criei barreira logo de cara. Ou de bico, quem sabe.]
Não gostei das crianças atuais, mais mecânicas e estridentes que as de 44. Tá certo que, em 44, uma delas era *a* Elizabeth Taylor, o que torna a comparação injusta. Também achei estranho terem colocado uma adolescente pra fazer a
Adéle; a garotinha de 44 era tão encantadora e... francesa! Na escalação das crianças, 44 venceu 06 pra mim.
Talvez por contar com um elenco mirim tão mais fraco, o arco que mostra a infância de
Jane foi menos desenvolvido na minissérie. Eu não sei se isso prejudicou a compreensão do caráter da personagem por parte de quem viu a história pela primeira vez; alguns comentários no site oficial criticaram muito o ritmo acelerado dos dois primeiros episódios, mas a maioria foi feita por quem também já conhecia o livro.
Até a metade do terceiro episódio ia tudo meio paripasso, filme e série, com uma que outra cena adicional e fotografia linda. A minissérie abriu mão da sutileza em duas seqüências que, no filme, foram filmadas de forma a não chocar a audiência da época, usando artifícios muito elegantes e que não deixavam dúvidas sobre o que tinha acontecido. Agora não necessitamos mais tanto prurido; ainda assim achei de uma crueza que destoou do tom.
Da metade do terceiro episódio até uns 3/4 do último não teve comparação: é um arco que foi cortado da adaptação de Aldous Huxley em 44, que transformou o clérigo
St. John Rivers [que
Jane conheceu pós-Thornfield] no médico
Dr. John Rivers de Lowood, a instituição para onde
Jane foi encaminhada pela
Tia Reed.
Nos últimos 15 ou 20 minutos do quarto episódio, aí sim, foi a redenção. A conclusão da minissérie me derreteu mais que a do filme. A essa altura eu já tinha esquecido o bico da Ruth Wilson e o fato de que Toby Stephens é
bonito demais para
seu próprio bem ser
Mr. Rochester. Acho que o fato desses minutos finais terem sido mais fiéis ao livro ajudou muito, passada a primeira estranheza de não ser narrado em primeira pessoa.
Pra quem gosta de romances de época [especificamente os vitorianos], recomendo a série com entusiasmo. E o livro. E o filme. Quanto à indicação pro Golden Globe, não sei se Ruth Wilson leva o prêmio porque não vi as outras concorrentes nas respectivas séries mas, intimamente, sinto que não haverá outra
Jane Eyre tão perfeita quanto Joan Fontaine. Quanto ao
Mr. Rochester perfeito, bem... Ainda espero este.
:o)
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