quinta-feira, fevereiro 17, 2005

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Fitei novamente os olhos do homem na foto. Ao seu lado, a jovem Agripina o olhava com adoração.

-- E a polícia não disse nada?

Ela sorriu de novo.

-- Cá entre nós, filha... não era do interesse de ninguém investigar muito, era?

Como assim?

-- A noiva dele... Não era interesse da família expor o casinho dela à luz do dia.

A senhora acredita nisso?

-- Eu sei.

Para pontuar a ênfase da certeza, um trovão forte ecoou fazendo vibrar as persianas da janela. Esta atmosfera, pensei - parece um filme de segunda categoria.

-- Vou preparar seu quarto.

A tempestade ia me prender naquela casa. Sem luz, sem telefone, sem aquecimento. D. Agripina levava a lamparina. Segui-a até um quarto ainda menor do que a sala. A cama de casal encostada à parede oposta à porta, um guarda-roupa com pelo menos um século de idade e a cômoda em que pousou a lamparina. O lençol esticado e o travesseiro cheiravam a lavanda; todo o resto do quarto parecia não ter visto vivalma durante os últimos vinte anos.

-- Você sabe onde fica o banheiro, caso precise, filha. Vou deixar a lamparina aqui. Amanhã a chuva deve passar. Boa noite.

Dizia estas palavras enquanto saía do quarto e fechava a porta atrás de si. O vento soprou frio pelas frestas da janela sem vidros. A chama da lamparina diminuiu por um instante. Abri o guarda-roupa na esperança de encontrar um segundo cobertor. Ao diabo minha alergia! Uma sensação gelada subiu pelo meu estômago: roupas masculinas estavam dispostas pelos cabides.